Donizete Pinheiro é Juiz de Direito aposentado, expositor e escritor espírita, editor do jornal Ação Espírita e diretor de doutrina do Grupo Espírita Jesus de Nazaré, de Marília/SP

 

Resenha: Nessa obra, o autor enfoca quatro dos cinco romances de Emmanuel, de lavra da psicografia de Chico Xavier, que relatam histórias e personagens do cristianismo nascente: Há 2000 anos; 50 anos Depois; Ave Cristo; e Paulo e Estevão. Entre trechos das obras e comentários, o autor nos leva a refletir sobre o tempo em que o cristianismo não havia sido contaminado pelos interesses materiais, conduzindo-nos a pensar sobre o que devemos fazer para retomar a essência dos ensinamentos, não só do ponto de vista filosófico, mas, sobretudo, como norte de conduta. Nas palavras do autor: O desejo é o de que, sabendo das lutas e sofrimentos dos primeiros cristãos, possamos nos animar e fortalecer no conhecimento, na divulgação e na vivência do espiritismo.

 

  1. Qual a importância de conhecer o cristianismo primitivo?

Aprendemos com a Doutrina Espírita que Jesus é o nosso modelo e guia. Seu evangelho é o roteiro moral sublime oferecido à felicidade das pessoas. Conhecer a saga dos cristãos primitivos, suas lutas e sacrifícios pelo cristianismo nascente, é emocionante e fortalece o nosso ideal espírita.

A partir dessa compreensão, podemos prosseguir aprendendo, vivenciando e divulgando o próprio espiritismo, que interpreta o Evangelho à luz dos ensinamentos dos Espíritos Superiores, propondo uma vivência fraterna e simples.

 

 

  1. Vemos que o cristianismo primitivo era repleto de fraternidade, sem hierarquia. Muitos dos que conheceram Jesus tornaram-se pregadores e abriram o próprio lar para as pregações. É possível retomar essa pureza? Temos que extinguir as religiões?

O cristianismo dos primeiros séculos realmente era marcado pela simplicidade e fomentado por adeptos sinceros, fraternais, corajosos e capazes de pregar a mensagem da Boa Nova. Aos poucos, surgiu uma certa hierarquia moral, baseada no valor daqueles missionários que mais se entregavam ao trabalho e ao sacrifício de servir ao próximo. No entanto, adotado pelo Império Romano como religião, não demorou para que a autoridade humana do cargo fosse mais importante, daí se originando uma igreja hierarquizada e dogmática.

Todas as religiões são importantes e constituem um modo de nos ligarmos a Deus, mas o progresso da inteligência e do pensamento devem levar à justa adequação, sob pena de desaparecimento. Allan Kardec, por sua vez, nos ofereceu o espiritismo como uma ciência de consequências filosóficas e morais (religiosas), tendo por lema a caridade desinteressada. Como ciência que é, o espiritismo nos dá a liberdade de pesquisa, interpretação e vivência, permitindo-nos um debate sincero, fraternal e respeitoso.

Compete a cada espírita sincero cuidar para que a nossa convivência no movimento resgate a pureza dos ensinamentos de Jesus, tratando-nos a todos como irmãos e aprendizes do Evangelho. O centro espírita, não obstante possa e deva ser bem organizado e moderno, deve guardar a simplicidade nos relacionamentos entre os seus frequentadores.

 

  1. O romance Paulo e Estevão retrata muito do que foi registrado por Lucas em Atos dos Apóstolos, por exemplo. Qual a contribuição de Emmanuel em relação ao registro do Novo Testamento?

Lucas fez um registro sintético, parcial e pessoal do que ouviu e presenciou do trabalho dos primeiros cristãos, em especial da obra missionária de Paulo de Tarso. O nosso irmão Emmanuel ampliou a biografia do Apóstolo dos Gentios com informações recolhidas nos registros espirituais, permitindo-nos o conhecimento de ações, diálogos, pensamentos e emoções de vários personagens dessa maravilhosa página do cristianismo. Emmanuel, porém, foi muito além.

Quem ler os seus romances com atenção vai perceber que ele nos apresenta os diversos aspectos históricos e informações espirituais numa certa cronologia dos acontecimentos, sendo ele próprio um dos personagens dessa narrativa. Assim, essa cronologia do chamado cristianismo primitivo pode ser verificada nos romances Há dois mil anos, Paulo e Estevão, Cinquenta anos depois e Ave Cristo, nessa ordem, que é diferente da ordem em que os livros foram publicados.

Ninguém mais se propôs a uma tarefa semelhante, que acredito corresponder à realidade dos fatos, além de esclarecer lacunas e dúvidas anotadas pelos historiadores e estudiosos do Evangelho e do cristianismo.

 

  1. Além de Emmanuel, os espíritos Humberto de Campos e Amélia Rodrigues nos trazem muitas informações sobre a vida de Jesus. Qual a importância disso?

Cada autor espiritual alcançou uma parte das informações espirituais sobre a vida de Jesus e de seus seguidores. Como anotou João em seu Evangelho: há, porém, ainda muitas outras coisas que Jesus fez; e se cada uma das quais fosse escrita, cuido que nem ainda o mundo todo poderia conter os livros que se escrevessem (21:25).

Desse modo, as páginas desses bondosos espíritos, mesmo quando romanceadas, nos trazem importantes lições do Evangelho e somam ensinamentos necessários à nossa alegria, paz, coragem e esperança.

 

  1. Como o senhor vê a confiabilidade das informações de Emmanuel, trazidas pela psicografia de Chico Xavier?

Allan Kardec nos ensinou a passar pelo crivo da razão as revelações ou ensinamentos trazidos pelos espíritos; atento a isso, posso dizer que tenho grande respeito e confiança na obra de Emmanuel e no trabalho de Francisco Cândido Xavier, um trabalho de divulgação do Evangelho e do Espiritismo consistente e coerente, por mais de 70 anos, que muito contribuiu para o esclarecimento e o consolo das pessoas. Considero que esse trabalho está em harmonia com os princípios espíritas e nos ajudam a entender melhor a vida material e espiritual.

 

  1. Qual o papel dos romances de Emmanuel no conjunto de sua obra com Chico Xavier?

Os romances de Emmanuel são uma forma literária útil na divulgação dos ensinos evangélicos e espíritas, uma vez que muito agradam as pessoas que, em geral, acompanham emocionadas a narrativa.

Emmanuel é um escritor inteligente, escorreito, nobre, elegante e elevado, conseguindo prender a atenção do leitor. Posso dizer que seus livros, especialmente os romances, contribuíram para a minha formação literária, uma vez que, como participante da mocidade espírita, tive a oportunidade de lê-los ainda jovem.

 

  1. Algumas pessoas leem os romances de modo linear, por conseguinte, simplificam o texto, dizendo que as histórias são iguais, com muito sofrimento e o encontro com Jesus no fim. É isso? Como aproveitar essas obras em toda a sua grandeza?

Nesse caso, precisamos anotar que existem romances espíritas de variada qualidade e que muitos realmente possuem situações semelhantes, abordando relações afetivas, conflitos, sofrimentos, reajustes, reencarnação e vida espiritual. Alguns trazem conhecimentos aprofundados e um estilo que cativa e emociona; outros são de menor expressão, com uma narrativa mais simples. Porém, recordando Jesus quando disse que quem não é contra nós, é por nós (Marcos, 9:40), todo romance que não compromete o espiritismo tem sua utilidade e um leitor que aproveitará seus ensinamentos.

 

  1. Emmanuel, na encarnação como o senador romano Públio Lentulus, teve a oportunidade de conviver com o Cristo ainda encarnado. Encontrou-se com Jesus, mas não se converteu. Depois, teve a oportunidade de interceder por Jesus perante Pilatos, evitando a crucificação. Quase 2.000 anos depois, é peça importante no desenvolvimento da Doutrina Espírita. Como compreender isso?

Compreendendo, com a própria Doutrina Espírita, que todos temos a oportunidade de evoluir, saindo da ignorância para a sabedoria e do egoísmo para o altruísmo. O espírito Emmanuel, após a personalidade do orgulhoso senador romano Públio Lentulus, muito sofreu, aprendeu e se aprimorou em variadas reencarnações, ao longo de quase dois milênios, alcançando, agora nos tempos do Consolador, a túnica espiritual que lhe permitiu assumir importante responsabilidade na divulgação dos ensinos de Jesus e das leis divinas, na seara do Espiritismo.

Assim como ele, nós, que permanecemos na retaguarda, um dia também estaremos em melhores condições, se soubermos aproveitar o dia de hoje para o aprendizado dessas lições sublimes do Evangelho.

 

  1. Nos romances, o que podemos ver sobre a formação dos Evangelhos?

Os historiadores ainda hoje discutem sobre a autoria e a cronologia dos Evangelhos, em contrapartida, devemos nos apegar mais aos seus ensinamentos morais, a exemplo do que fez Allan Kardec ao escrever a sua obra O Evangelho segundo o Espiritismo, pois ali não há maiores controvérsias sobre tais lições. No entanto, acolhendo as informações de Emmanuel, sabemos que as primeiras anotações das lições imortais de Jesus foram feitas pelo discípulo Mateus, as quais serviram de norte para inumeráveis pregadores da Boa Nova, dentre eles Estevão e o próprio Paulo de Tarso.

Possivelmente, apenas depois, o Evangelho de Mateus foi formatado na apresentação que hoje conhecemos. O Evangelho de Lucas, bem como Atos dos Apóstolos, foram livros escritos a pedido de Paulo e já existiam antes que este fosse morto. Atos dos Apóstolos termina com Lucas dizendo que Paulo prosseguia pregando o reino de Deus e ensinando, com toda a liberdade, as coisas pertencentes ao Senhor Jesus. Sobre a origem dos Evangelhos de Marcos e de João, não há informações nos romances de Emmanuel.

 

  1. Os apóstolos criaram, em Jerusalém, a Casa do Caminho, humilde morada para atendimento aos desvalidos de toda sorte. Que lição podemos tirar disso para nossos dias?

Que a caridade desinteressada deve ser a nossa busca incessante, o ápice das virtudes a conquistar, porque revela a presença do amor em nossos corações. Pedro e os seus companheiros ergueram a Casa do Caminho, a primeira igreja do cristianismo, para cuidar dos mais infelizes, dos doentes, dos abandonados, porquanto essa era a recomendação de Jesus: que Pedro cuidasse dos filhos do Calvário.

Gamaliel, procurando defender os discípulos perante Saulo, argumentou: (…) mas o “Caminho”, Saulo, parece ter uma grande finalidade na renovação dos nossos valores humanos e religiosos. Quem, entre nós, se havia lembrado de amparar os infortunados com o provimento de um lar afetuoso e fraterno?

A lição que fica, portanto, é a de que devemos nos instruir com as páginas imortais do Evangelho e do Espiritismo, para nos entregarmos à vivência do amor, da caridade, onde estivermos e com quem estivermos.

 

  1. Qual a ideia para a obra O cristianismo nos romances de Emmanuel e qual seu objetivo?

Tendo lido e relido os romances de Emmanuel ao longo de vários anos e depois de ter apresentado estudos sobre o Paulo e Estevão e sobre o Cristianismo Primitivo a um grupo de um centro espírita, seguindo naturalmente a ordem cronológica, fui intuído a escrever esse livro, que gentilmente foi publicado pela Editora EME.

O desejo é o de que, sabendo das lutas e sofrimentos dos primeiros cristãos, possamos nos animar e fortalecermo-nos no conhecimento, na divulgação e na vivência do espiritismo. Também esperamos que os leitores possam recorrer às belíssimas fontes, que são as obras do nosso irmão Emmanuel, aprendendo com os inumeráveis exemplos de vida e ensinamentos sublimes.

 

Donizete Pinheiro mantém o que chama de Rede Marília Espírita de Informações, para divulgação do movimento espírita, em que inclui as edições do jornal Ação Espírita

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